Rui Cóias


Mediterranean

Places don’t exist, never existed, not even the ancient ones.

What exists is what we see in them, the brick dust traces making them vanish.

Only thus we’ll land. Lightly, just for the remembrance.

Not in order to touch the lilac columns or go across on the tangerine sailing boat.

Only vaguely we progress. We don’t walk under the sun.

The nomads’ feet are not blackened by the sand and the sea in small ports.

The elms shelter us, not the terraces.

The dust traces bruise us with a faint drop

we can wile between our fingers and still it doesn’t solidify.

Nothing has changed since the first lament; the eyes

taking us along the Mediterranean horizon are our eyes,

and the olive trees its day-long boundary.

©Translation: Ana Hudson

Mediterrâneo

Não há lugares, nunca houve, nem mesmo antigos.

Há o que olhamos neles, a sua marca de pó de tijolo que os faz sumir.

Só assim conseguimos chegar. Só brandamente, para lembrarmos.  

Não para tocar as colunas liláses ou fazer a travessia no veleiro das tangerinas.

Só vagamente andamos. Não caminhamos, debaixo do sol.

Os pés dos nómadas não enegrecem com as areias e as águas de pequenos portos.

São os ulmeiros que nos protegem e não os seus terraços.

A marca de pó fere-nos numa gota desmaiada, 

podemos entretê-la mesmo entre os dedos que não petrefica.

Nada mudou desde o primeiro queixume; foi 

com os olhos que partimos na linha do Mediterrâneo

e são as oliveiras o seu diurno limite.

The Valley 

There are no lives left, nor is there a new beginning through their endings,

nor will love bestow on us an insinuating smile,

nor will the past leave insinuating breaches in the present,

nor will I lightly touch my time,

nor will god touch us in no man’s land,

nor will I pass through it without remembering, nor will I just pass through.

We were left with promises of a distant hope,

our shoulders’ halo spread over hot sands,

and each outward breath was the last without us knowing it 

-– it’s so slight that we don’t notice its extinguishing,

the dispelling  of its hesitating rustle,

the drifting of the faint smoke of our having been

no more than the crash of a swerving body.

What will become of us if only one truth is the truth

-– our life being exerted in it, nothing but a vigilant semblance

halting the flow of the moving light, and the void of movement

whispering each immediate name – never seen, yet to be

slaughtered, yet to become –  even if we are 

momentarily numbed into something else

as if imagining the sun on a field of olives

or the evanescent gentleness it contemplates,

its lovingness nonetheless, its close call touching the mirror

although its kiss is its regained strength, just like a son 

— what will become of us?

And the vines descend — slowly descend,

and we are hushed, anticipating the time to come —

and my father points at the enclosed olive groves ablaze, and

his voice in the night escapes the afternoon, through a tunnel

— my father declares, watching the dogs in the distance, this is the end of the path,

my father  insists this is the end of the path, the dogs in the distance 

— and we all love the world, and what happens in it at every step,

and the origin of each one of us, the presence, the parting

— we all love the overturned world, the spike on its summit, its secret

— we all fear the innocuous breathing, our 

departing hour – the lustreless detour, and the incense,

the impeding detour,

its announcing toll. 

© Translation: Ana Hudson

O Vale

Não há mais vidas, nem o recomeço delas por algum fim,

nem o amor nos deixará um sorriso insinuante,

nem o passado deixará frestas insinuantes no presente,

nem no meu tempo levemente tocarei,

nem deus nos tocará numa terra de ninguém,

nem por ela passarei sem que me lembre, nem por ela passarei.

Deixaram-nos promessas a esperança longínqua,

o halo de ombros espraiado em areias quentes,

e cada expiro foi o último sem que o soubéssemos

— tão fraco é que não o notamos extinguir-se,

dissipar o seu alento hesitante,

escorrer o fumo ralo de não mais ter sido

que o estampido de um vulto a desviar-se.

Que há-de ser de nós, se só uma verdade é a verdade

— que nela se exerce a nossa vida, só aparência vigilante,

a estancar a luz em movimento, e o vazio do movimento,

a suspirar cada nome próximo — jamais visto, massacrado,

que há-de ser — que há-de tornar-se,

embora instantaneamente adormecidos noutra coisa,

como a imaginar o sol num campo de azeitonas

ou a doçura evanescente que contempla,

embora amando, ouvindo chamar ao perto, rente ao espelho,

embora o beijo seja a resumida força, como um filho

— que há-de ser de nós?

E as vinhas descem — tão demoradamente descem,

e silenciamos, já pensando na hora que virá

— e meu pai aponta os olivais vedados, em chama, e

a sua voz escapa-se da tarde à noite, por um túnel

— meu pai afirma, com os cães em fundo, que o caminho acaba aqui,

meu pai repete que o caminho acaba aqui, com os cães ao fundo

— e todos amamos o mundo, e o que dele passa em cada ponto,

e a origem de cada um, a presença, e o adeus

— todos amamos o mundo soçobrado, a espiga no cume, o segredo

— todos tememos a respiração inócua, a nossa

hora — o desvio embaciado, e o incenso,

o desvio que já adiante vem,

que já adiante vem a retinir.

December

The eyes bring places closer

to the heart. Now on the way back I think of this

while we signal to each other with the headlights,

on the fast road, as evening falls.

We gaze slowly at life and mainly

thus do we take in the silences, names

returned to the silence so brief – the house

outlined by mist, the village standing still as

we wander in a group, the comforting 

coffee that I hold in my hands: 

– how to say these are the most secret

regions of the soul to which we keep reverting

during the harshest December frosts? If we’re suddenly

told we are but a fragile eternity away of days of disquiet, you cross

one hand over the other and face this misty 

light beam, smiling at times to me and I feel so very happy.

And on the way back, when again I feel startled 

and night draws in on the empty roads as the world sleeps,

there’s a loneliness shivering along, a fretting

underneath the tongue like an insistent drizzle.

How then to speak of your face leaning towards me

or of the furthest spot in the pine wood? How

to believe time won’t bring to our eyes

the immense forsakenness that befell us?


©Translation: Ana Hudson

Dezembro

São os olhos que aproximam os lugares 

ao coração. Agora que regressamos é nisto que penso

enquanto fazemos sinais uns aos outros com 

as luzes, na rápida estrada, ao anoitecer.

Olha-se devagar para a vida e sobretudo 

assim damos conta dos silêncios, dos nomes 

devolvidos ao tão leve silêncio — a casa 

vincada pela névoa, a aldeia imobilizada ao 

passearmos em grupo, o café que 

me conforta quando o recebo entre as mãos:

— Como dizer que são estas as mais secretas 

regiões da alma a que voltamos sempre, nos maiores 

frios de Dezembro? Se de repente dizem que estamos 

a uma eternidade frágil dos dias inquietos, cruzas 

uma palma da mão sobre a outra e olhas

para esse raio luminoso da bruma, rindo 

de quando em vez para mim, que fico tão tão feliz.

E no regresso, quando os sobressaltos se repetem

e anoitece nas estradas vazias e o mundo adormece,

há uma solidão que estremece nas bermas e nos 

aflige debaixo da língua, como uma chuva miudinha.

Como falar depois da tua inclinada cara a meu lado

e do recanto mais longínquo dos pinhais? Como 

acreditar que o tempo não trará aos olhos a 

maior solidão, em que ficámos?

Rui Cóias was born in Lisbon, Portugal. He graduated in Law from the University of Coimbra, has a postgraduate degree in Legal Sciences. He is the author of the books The Function of the Geographer and The Order of the World. In 2016 his last collection of poems, Europa, was published in Portugal which includes, among others, a series of texts based on the World War 1914-18, written on the occasion of a fellowship awarded by the French Ministry of Culture and Communication. This book was recently published in Mexico (Las Margenes Sombrias) and in Holland  (Laat de stilte) with translations to Spanish and Dutch. Rui Cóias’s poetry has also been published in Belgium (La Nature de la Vie) and in France (L`ordre du monde). He has also published in several anthologies and publications in Portugal, Slovakia, Italy, Romania, Macedonia and Brazil. He has presented his work in Switzerland, France, the United States, India and Turkey and represented Portugal in several important festivals and literary meetings around the world. He is also one of the Portuguese authors featured on the web platforms such as Poetry International Web (Rotterdam), Poems from the Portuguese (Portugal) and Lyrikline (Germany). He has a travel literature blog and lives in Lisbon.

Ana Hudson has a master’s in Portuguese studies (history path) from King’s College London. She is responsible for the translations at Poems from the Portuguese, the most comprehensive anthology of twenty-first-century Portuguese poetry online (and offline). She published in English the book He Went to England: Impressions of an 18th Century Portuguese Aristocrat (Alêtheia, 2015) and lives in the UK.